Observo a vida por uma fresta. Sempre de fora, sempre atrás.
O jogo incessante da vida me interessa mas me assusta,
Me estimula mas me reprime,
Me fascina mas me enlouquece,
Eu, permaneço imóvel.
Tudo me dói, me rasga, me atinge de uma maneira não humana,
Não consigo viver nem sentir na mesma medida que todos,
É sempre demais, ou de menos,
É sempre errado, difícil, incabível, inexplicável
Sempre me escapa,
Sempre me incomoda.
Me identifico com flores, ventos, sons, aromas e paisagens.
Lugares me fazem melhor companhia do que pessoas.
Quando sinto o tato do vento tocar no meu rosto, todos os beijos se escondem,
Quando sinto o aroma da chuva vindo de longe, todos os perfumes se desfazem,
Quando vejo a beleza de uma flor que mesmo frágil, se entrega ao chão no outono, todos os rostos se dissolvem,
Quando ouço o assobio de uma montanha alta, todas as vozes se calam.
Quem dera poder me apaixonar por um rio
E sem mais explicações ou porques
Me atirar na correnteza incerta
E me deixar levar por ele, só ele.
Penso. O que resta, afinal?
De todos os caminhos, os abraços, os beijos, os suores, os desencontros,
De todo o egoísmo, de toda a ira, os choques, os espasmos,
De todos os tombos, os tapas, as chicotadas,
De todo o álcool, o ópio, o pó,
De todo grito, sufoco rouco, tiros,
De todas as impossibilidades,
O que nos resta, afinal?
Impossível viver e ainda assim insisto.
Todos os dias insisto.
Acordo na ânsia de me tornar um pouco mais humana.
E durmo com a certeza de que não sei sentir.
Não sei. Ter um lugar na vida.
Ser cotidiana, prática, rasa, simples, leve,
Não.
Pra mim é sempre fora do esperado.
Não encontro minha humanidade.
Deus? Onde está, Deus?
Por vezes me encontro num abraço apertado de saudade,
Nos olhos enrugados de um velho sábio,
Na espontaneidade de uma menina saltitante,
Me encontro, por breves momentos,
Na liberdade de um cachorro vira-lata,
Num gesto caridoso sem razão,
Num soldado que morre pela pátria,
Numa troca de olhar inesperada.
No espelho, nunca me encontrei.
O espelho me mostra uma desconhecida,
Formas que não me pertencem,
E um rosto pedinte.
Sonhos?
Sim, os tenho.
Será que é isso que me torna humana?
Meus sonhos são sempre sob ou sobre humanos,
Não estão na esfera possível de realização,
São sonhos impertinentes pra um mundo que não olha um pro outro.
Sou sincera me contradizendo a cada minuto,
Sou desagradável e não me suporto,
Pelo puro gosto da contradição
Que mora dentro de mim.
Sou metáfora incompreensível,
Sou um grito forte no meio da noite,
Sou abismo infinito.
Fui educada por situações e não por professores, mães ou pais.
Não há nada que me cause mais paixão do que as pessoas.
Não há nada que me cause mais nojo do que as pessoas.
Quero tudo e tudo me falta,
Ausência
Trepidação
Solidão.
Gosto do gosto salgado da lágrima
E por isso choro
Sentir, sentir, sentir a ponto de não sentir.
Só me contentaria se conseguisse abraçar todo o mundo de uma vez só,
Se conseguisse sentir todos os sentimentos num único momento.
Pra depois me transformar.
3 comentários:
isso tudo a torna muito humana e bela, edelvais. sinto que expressou sua verdade com a transparência do rio mais limpo.
compartilho do que diz e reafirmo, sem demagogia ou pedantismo, junto ao nosso pequeno príncipe, que só se pode ver com clareza com os olhos do coração e para se viver bem aqui só com muito amor.
a explosão de uma supernova.
Gostei!! Achei que mandou muito bem! Parabéns pelas palavras!
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